quarta-feira, 10 de novembro de 2010

SOFT SKILLS & LIDERANÇA, Será Possível Construir um Líder?

Por: Vitor M. Trigo
vitor.trigo@gmail.com
10 Novembro de 2010


Toda a gente tem, teve, ou terá alguma vez um chefe.
Ao longo da vida, muitas pessoas tiveram, ou terão, oportunidades de virem a assumir responsabilidades de chefia ou supervisão. Poucas, muito poucas mesmo, desfrutaram, ou virão a conhecer, o prazer de terem sido, ou virem a ser, reconhecidas como líderes.

O que é um líder

É usual referir-se que líder é aquele que consegue concretizar os resultados através do empenho motivado e satisfeito dos outros. Contudo, esta definição pode aplicar-se, pelo menos conjunturalmente, a gestores, chefes, supervisores, e até manipuladores. A História, até ao nível da política, está recheada de exemplos. Duvida? Então repare se não é verdade que quando alguém ascende ao topo dum partido político, é de imediato e sem quaisquer provas dadas, apelidado de líder. Chamo a isto, benevolamente, terminologia de caserna, prática corporativa.
Há, portanto, que ver se nos entendemos acerca do conceito de liderança e do que significa ser líder.
Podemos pensar que líder é alguém com poder para decidir em nome do grupo, o que será deveras redutor. Abundam as pessoas que têm poder, por competência técnica, pela informação que detêm, pela delegação que lhes foi outorgada e que só mandam, quando mandam, e não conseguem ter seguidores que neles confiam. E quantos indivíduos conhecemos, que sem poder formalmente atribuído, ao nível de seus pares, são consistentes fazedores de opinião, consultores dos seus iguais, e muitas vezes temidos pelos superiores.
Também podemos pensar em avatares rotulados de inteligências superiores, medalhados por inúmeros títulos académicos, rotulados de visionários, possuidores do que auto-intitulam de “capacidade para decidir depressa”, senhores de clarividência que só eles próprios vislumbram, intrépidos negociadores de causas imaginárias. Procuram corporizar o que não passa de complexos de superioridade, ou, talvez pior ainda, os que procuram superar complexos de inferioridade ou depressões mais ou menos profundas, através do exercício de gestão.

Liderança e Inteligência Emocional

Daniel Goleman, no artigo de extraordinário sucesso ”What Makes a Leader”, defende que os alicerces da liderança se encontram na Inteligência Emocional, cujos atributos são, segundo ele:
• Auto-consciência (Auto-percepção Emocional, Auto-avaliação, e Auto-confiança);
• Auto-gestão (Auto-domínio Emocional, Transparência, Capacidade de Adaptação, de Realização e Iniciativa, de Optimismo);
• Empatia (Capacidade para entender as questões alheias como se fossem próprias, Capacidade para ser considerado como confidente);
• Consciência Social (Consciência Organizacional e Espírito de Serviço);
• Gestão das Relações (Liderança Inspiradora).
Os dois primeiros grupos constituem Competências Pessoais e os três últimos as Competências Sociais, como referi em ”Soft Skills, o Desafio a Ganhar”. (Para maior detalhe consultar ”Os Novos Líderes”, também com a assinatura de Goleman e outros).
Como a listagem sugere não é fácil encontrar num só indivíduo tantas qualidades, e, de facto, os autores também reconhecem nunca terem encontrado alguém dotado de todas estas qualidades em níveis superiores. O importante é que nos estudos que efectuou, aequipa de Goleman pode concluir que os líderes considerados como eficazes possuíam pelo menos seis das referidas competências em níveis superiores (op.cit. pág 60).
Daniel Goleman é um guru em Inteligência Emocional, uma ciência relativamente recente que encontra fundamento no domínio mais abrangente designado como Soft Skills. Será útil, antes de avançar, rever como defini Soft Skills em ”Soft Skills – Definindo Limites”, e “SOFT SKILLS – Uma Tentativa de Roteiro”.

Nasceu para dominar, é um líder nato

Bom, mas onde está a vantagem da aproximação Soft Skills na arte de liderar?
Para começar é necessário desmistificar algumas perigosas crenças que infestam certos meios empresariais, como sejam:
• Que a liderança é uma questão de experiência acumulada, uma espécie de “autoridade” justificada pela “patine” dos galões, como Tony Soprano na série televisiva Os Sopranos, e publicado em livro em Portugal pela Bertrand: ”A Gestão segundo Tony Soprano”;
• Seguindo a teoria de Nicolau Maquiavel – Que o ideal é poder ser-se amado e temido. Contudo, se for preciso optar, é mais seguro ser-se temido (”Maquiavel – O Princípe”, aqui das muitas edições em Português).
Não existem provas de que as capacidades de liderança sejam inatas. Tão pouco é aceitável que a aprendizagem, unicamente baseada na experiência acumulada (eventualmente, más experiências) possa, por si só, aportar qualquer valor acrescentado (a não ser a reflexão com propósitos rectificativos). Nem alguém pode hoje pensar que o comando preconizado por Maquiavel, e tantas vezes seguido por pretensas cópias de Napoleão, possa actualmente encontrar terreno propício à germinação (esta edição de "O Príncipe", ed. Europa-América, Livros de Bolso (1976), inclui 773 interessantíssimos comentários de Napoleão Bonaparte, esse emérito manipulador).
Algo diferente terá de explicar porque tantos jovens brilhantes nos estudos fracassam nas carreiras profissionais, enquanto alunos médios se tornam verdadeiros ícones nos mais diversos ramos, particularmente na vertente liderança.
Segundo Goleman e seus inúmeros seguidores, Inteligência não é hoje considerada uma capacidade única, antes um compósito de diversas disciplinas, como Gardner mostrou com a Teoria das Inteligências Múltiplas (ver ”Soft Skills, o Desafio a Ganhar”).
A boa notícia é que a Inteligência Emocional (na terminologia de Gardner, as vertentes inter e intra relacionais do abrangente conceito de Inteligência Total) se pode desenvolver.
Assim sendo, todos podemos melhorar as nossas capacidades relacionais e ambicionar a patamares superiores de sucesso, com evidentes vantagens no exercício de liderança. É claro que existem características pessoais que podem facilitar ou inibir este propósito, dentre os quais relevam a resiliência, a motivação, a comunicação, e sobretudo o carácter. Ser flexível, atitude que também se pode desenvolver, encarar a aprendizagem como um processo contínuo, e entender a adaptabilidade como indispensável, encarregar-se-ão do resto. E agora sim, e só agora, há que interpretar correctamente e implementar de forma adequada o que as boas técnicas e as boas práticas nos oferecem para facilitar o caminho.

Estilos de liderança

Não existe um estilo de liderança único, nem algum que seja mais recomendável. A prática de liderança é determinada pelas características do líder, dos liderados, e pela envolvente. Trata-se dum permanente exercício de adequação situacional, embora quase tudo se centre na gestão de reforços positivos e negativos. O recurso a punições deve, contudo, ser encarado como normal, e muitas das vezes salutar, na prossecução da justiça com equidade.
O Hay Group desenvolveu um modelo para identificação do que considera serem os seis estilos individuais de liderança mais preponderantes – Visionário, Conselheiro, Relacional, Democrático, Pressionador, e Dirigista (Para informação mais detalhada consultar o Capítulo Quatro da obra de Goleman et. al ”Os Novos Líderes”, Capítulo Quatro).
Os quatro primeiros estilos são geradores de ressonância, e baseiam-se na prática de reforços positivos. Tendem a criar ambientes inovadores e climas positivos. Os dois últimos recorrem essencialmente a reforços negativos e práticas punitivas, sendo potenciadores de dissonância.
O líder de excelência recorre a cada um dos tipos de liderança referidos, conforme a exigência da situação que enfrenta.
A ordem porque estes estilos foram mencionados corresponde ao grau de eficácia sustentável que propiciam. Dos primeiros esperam-se eficiência e eficácia de longo prazo; dos restantes, na melhor das hipóteses, resultados de curto prazo.

Da teoria à prática

Tive a oportunidade em 2002 de me submeter a um teste baseado nesta filosofia, desenvolvido pelo IBM Management Development e tratado em parceria com o Hay Group. Foi uma experiência fantástica.
Eram mais de 200 questões, agrupadas por temas, sobre os meus comportamentos como líder. A minha auto-avaliação foi comparada com as opiniões dos membros da minha equipa, dos meus pares, dos meus superiores e… dos meus clientes. As questões eram as mesmas para eles e para mim.
O resultado foi surpreendente e permitiu-me que me modificasse. Por exemplo, a minha auto-classificação como Coach foi 37 pontos, enquanto a média dos meus avaliadores revelava uns surpreendentes 78 pontos, numa escala de 100! Não tinha a consciência de exercer Coaching com tanta incidência.
Retirei enormes ensinamentos desta experiência, não só no recurso a este estilo como na utilização mais equilibrada dos outros.

Assim sendo…

Em jeito de conclusão, justifica-se a polémica sobre se liderar é uma ciência, uma arte, ou uma prática. Por mim prefiro considerá-la uma arte pelas razões invocadas. Não contesto que o QI (Coeficiente ou Quociente de Inteligência – ora aqui está outra questão a justificar uma agradável reflexão) e as Competências Técnicas (Hard Skills) sejam importantes, mas, em questões de liderança, o sine qua non é a Inteligência Emocional (Soft Skills).
Quanto à possibilidade de construir um líder, respondo que sim. Mas a matéria-prima tem de possuir Soft Skills de primeira qualidade. O resto é adição de boas práticas. Nada de transcendente.

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