sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Alterações Ambientais (parte 2 de 3)

Petróleo, População, Novas Fontes de Energia
A Teoria “Beyond”


Por: Vítor M. Trigo
vítor.trigo@gmail.com
07 Outubro de 2010

No artigo anterior Alterações Ambientais (parte 1 de 3) apresentei a colecção dos três textos previstos e abordei a Teoria Olduvai, ou do Declínio Terminal Eminente, cujo autor Richard C. Duncan, engenheiro e MS em energia eléctrica e PhD em engenharia de sistemas, defende. Como referi, de acordo com este autor o futuro próximo será catastrófico, se a humanidade não inverter os hábitos e a dependência energética concentrada no petróleo, carvão, e electricidade tradicional.
A perspectiva Beyond, da autoria dos PhD Mario Raich PhD e Simon Dolan também não é animadora. Debruça-se, no essencial, no crescimento incontrolado da população e nos efeitos sobre a humanidade e o planeta.

“Beyond”, ou Para Além da Zona de Conforto

Tive o prazer de assistir a uma conferência dos PhD Mario Raich e Simon Dolan em Lisboa [1]. Não conhecia estes autores que me surpreenderam pela coerência e pela objectividade. De facto, as suas intervenções não são muito optimistas no que respeita ao futuro que nos espera se persistirmos nos mesmos erros. As suas preocupações focalizam-se no crescimento incontrolado da sociedade humana e na incapacidade da Terra suportar esta pressão dentro dos actuais padrões de vida.
Em resumo, quais são as principais preocupações destes autores?
• Temos um estilo de vida insustentável
• Crescemos a 80 milhões pessoas / ano (uma nova Alemanha todos os anos)
• 90 % dos 1.5 mil milhões de jovens vivem em países em vias de desenvolvimento
• Iremos ter 50 milhões de desalojados nas próximas décadas, só por causa de inundações
• Enfrentaremos novas guerras e terrorismo
• Já ultrapassámos o “Pico do Petróleo” (Duncan afirma o mesmo, como relatado no artigo anterior)
• Precisamos de 15 mil milhões de euros para infra-estruturas (verba irrisória se comparada com o valor calculado por estes autores para reforçar a rede eléctrica mundial usando a tecnologia actual – 60 triliões de US$ até 2030 [2] )
• Vivemos um urbanismo insuportável (mil milhões de pessoas vivem em bairros degradados)
• A nossa vida é uma “Realidade virtual”

O quadro não é animador, e o discurso de Mario Raich segue a mesma linha - não é confortável ouvi-lo, o que não é de espantar pois o próprio considera a sua mensagem como “para além da zona de conforto”. Eis o que M Raich identifica com as grandes origens dos problemas actuais:
Demografia ► Deterioração Ambiental ► Migração ► Conflitos ► Pobreza
Note-se que alguns destes passos podem ser ultrapassados, alcançando-se o fim da linha de forma mais rápida e contundente. O resultado final é sempre o mesmo – insustentabilidade.
Detalhando um pouco, os autores observam que de acordo com os relatórios da UN [3]:
• Em 2005 existiam 200 milhões de migrantes;
• 1/3 destes eram migrantes sul-sul, o que é surpreendente;
• As UN calculam que dentro de 45 anos possam existir 2.2 milhões de migrantes dos países subdesenvolvidos para os países desenvolvidos;
• Destes cerca de 1.1 milhões poderão tentar migrar para os USA.
É claro que poderá argumentar-se que se não for assim, os países desenvolvidos terão de abandonar o actual conceito de estado social e outros institutos que se baseiam na colecta de impostos directos sobre o trabalho. E também não se podem negligenciar as remessas que esses migrantes canalizarão para os seus países de origem. No seu conjunto, em 2004, os países subdesenvolvidos captaram 130b US$ em investimentos externos e receberam 160b US$ em receitas dos seus emigrantes [4].
Como consequências mais gravosas destes fenómenos, salientam-se [5]:
• Procura crescente de proteínas, o que implica excesso de gado em pastagens escassas e consequente destruição de áreas florestais, para além de acréscimo significativo nas emissões de CO2;
• Produtividade e mobilidade acrescidas, com inerentes aumentos da temperatura ambiente;
• Degradação do cultivo das terras, pela procura acrescida de trabalhos urbanos, e consequentes migrações internas e externas;
• Aumento e concentração das populações, que contribuirão para a escassez de recursos:
• Maior esperança de vida, o que implicará populações cada vez mais envelhecidas e novos problemas no financiamento dos Estados.
Face a tão dura realidade e rejeitando qualquer hipótese das sociedades prosseguirem insistindo exclusivamente em valores materiais, Beyond propõe-nos um mundo novo centrado nas pessoas numa perspectiva holística.
A primeira camada de valores a colocar em torno das pessoas, funcionaria como filtros com a envolvente, a saber: Valores Emocionais, Valores Espirituais, Valores Éticos, e Valores Económicos. Seria este conjunto estruturante, que, através das suas ligações todos-a-todos, asseguraria o equilíbrio dos vectores dominantes no mundo novo: a Família e os Amigos, a Educação e o Desenvolvimento, a Filantropia e a Caridade, a Cultura e a Arte, o Trabalho e o Negócio, a Sociedade e a Política. [6]
Pode parecer um modelo demasiadamente vago, utópico até. Mas uma proposta de clivagem com as sociedades actuais, tem de ser suficientemente genérico para ser abrangente e reunir valores que não sejam rejeitados de imediato.
Gosto da mensagem, e penso que vale a pena encará-la com seriedade. Por isso a trago aqui com este detalhe. Julgo que ela poderá ajudar a:
• Purificar o ar, melhorar a qualidade das águas, e assegurar alimentação para todos sem aumentar a degradação do ambiente;
• Proteger os ecossistemas;
• Reduzir as emissões de CO2;
• Limitar a corrida às armas de destruição massiva;
• Explorar correctamente as nano e biotecnologias, e outras tecnologias emergentes;
• Limitar as guerras por recursos básicos, como a água potável;
• Conviver com o mundo virtual;
• Controlar as migrações em massa;
• Construir um mundo verde.
Releve-se que, partindo de enfoques distintos, as Teorias Olduvai e Beyond apresentam de comum: (1) leituras preocupantes da realidade actual; (2) perspectivas sombrias do futuro próximo; (3) urgência na tomada de decisões fracturantes sobre o nosso modo de vida colectiva; (4) recusa no aproveitamento simplista de fenómenos da natureza imputáveis a factores antropogénicos.
Considero particularmente interessante o estudo conjunto destas duas Teorias – Olduvai e Beyond.

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NOTAS:

[1] Mario Raich é um distinto pensador do futuro. Da sua actividade profissional destacam-se Visiting Professor (HEC, Paris), Visiting Professor (ESADE Graduate School of Business, Barcelona), GSM da Educatis University (Altdorf), Associate Professor e Founding Director do Institute for Strategic Innovation.
Simon Dolan, por muitos considerado utópico, insiste em que a sua preocupação se chama sustentabilidade. S Dolan é Doctor of Philosophy (Organizational ychology/Behaviour & Administration (University of Minnesota), Master of Arts (IR/Human Resource Management (University of Minnesota), M.A. Human Resource Management (Tel Aviv University), M. Sc. in Organizational Behavior (Tel Aviv University), e B.A. Labour Studies (Tel Aviv University).
Em conjunto editaram Beyond – Negócios e Sociedades em Transformação, 2008, Lisboa, Bnomics – Almedina, uma obra que dá gosto estudar e apreciar.
[2] Como referência, o PMB (Produto Mundial Bruto) em 2006 foi 67 triliões de US$ - Raich, M e Dolan S (2008): Beyond, pp. 99-114, pp. 120-125, Bnomics, Almedina
[3] op. cit. , p62
[4] op. cit. , p62
[5] op. cit. , p62
[6] op. cit. , p128

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