domingo, 10 de outubro de 2010

Alterações Ambientais (parte 3 de 3)

Petróleo, População, Novas Fontes de Energia
O Ficcionismo de “Uma Verdade Inconveniente”


Por: Vítor M. Trigo
vítor.trigo@gmail.com
10 Outubro de 2010

A terminar a trilogia “Alterações Ambientais”, e como prometido, chegou a hora de abordar o romance de ficção “Uma Verdade Inconveniente” (UVI) [1] que Al Gore [2] publicou com tanto êxito, que até lhe valeu o Nobel da Paz de 2007. Pode gostar-se ou não do estilo literário do autor, mas o conteúdo, esse é facilmente contestável sob o ponto de vista científico. Foi o que Marlo Lewis Jr, PhD [3] fez na sua obra “A Ficção Científica de Al Gore” [4], utilizada aqui como referência sistemática.
Marlo Lewis Jr. desmonta ponto por ponto as principais mensagens alarmistas de AL Gore, mostrando como elas não passam de interpretações especulativas de fenómenos que podem não ter a origem antropogénica que Gore lhes atribui, chegando mesmo a afirmar que algumas são falsas. Da capa de “A Ficção Científica de Al Gore” consta: “As alterações climáticas resultam de ciclos naturais em que o ser humano tem pouca ou nenhuma influência. As consequências catastróficas imputadas à acção do Homem pelos propagandistas do aquecimento global não têm fundamento científico” [5].
Ninguém ousará negar que a actual dependência energética nos países desenvolvidos é uma questão premente. Veja-se por exemplo, como a Europa tem de inverter a perigosa dependência em que se encontra: A Irlanda importa 90.9% da energia que consome, a Itália 86.9%, Portugal 83.1%, Espanha 81.4%, Alemanha 61.9%, França 51.4%, Reino Unido 21.8%. A Dinamarca produz mais 36.8% do que consome. [6] Até sob o ponto de vista de segurança esta situação é muito perigosa.
Lewis aborda e desmonta mais de uma centena dos mais emblemáticos cavalos de batalha de Gore. Aqui se citam algumas consideradas como as mais convenientes para abordar as lutas internacionais que se avizinham.

As cíclicas oscilações térmicas do planeta

Contrariando o alarmismo dos catastrofistas, Gore incluído, Lewis estuda o passado longínquo mostrando que as oscilações térmicas da Terra têm sido cíclicas e, acima de tudo, naturais.
Os “Períodos Quentes”, com temperaturas superiores às que hoje estamos a verificar ocorreram entre 8000AC e 3000AC (Óptimo Climático Holoceno), 200AC a 50DC (Período Quente Romano), e 800DC a 1300DC (Período Quente Medieval). Os “Períodos Frios”, deram-se entre 1350AC e 1250AC (Óptimo Climático Idade do Bronze), 100DC a 700DC (Período Frio Idade das Trevas), e 1350DC a 1850DC (LIA – Little Ice Age). Como se observa, as altas temperaturas alternaram com as baixas, de forma cíclica. [7]
Questiona-se, então: Porque ignora Gore tão importantes dados? Não acompanham as suas teorias que atribuem ao homem e à combustão fóssil todos os males?
Idêntico raciocínio se aplica quando Gore pretende demonstrar que as neves do Kilimanjaro estão a derreter de forma irreversível devido ao aquecimento global do planeta (sempre e só com origem nas emissões de CO2). Ora, Lewis apresenta registos que mostram que a dita liquefacção constante e acelerada a que Gore se refere, não corresponde à realidade: Em 1950 o Kilimanjaro perdera 45% das neves em relação a 1900. Nesse período verificou-se um aquecimento do ar na zona. Contudo, de 1953 a 1976, numa altura em que as temperaturas desceram, voltou a verificar-se uma diminuição de 21% no volume total das neves. De 1976 a 2000, de novo debaixo de um aquecimento do ar, as neves voltaram a recuar 12%.
É patente o recuo das neves do Kilimanjaro, mas não se pode afirmar que essa perda seja acelerada, como Gore afirma. Tão pouco se pode dizer que este fenómeno se deva a gradual aquecimento global, que não se tem verificado. Lewis defende que o recuo das neves coincide com a mudança de ar húmido para ar seco que se verificou em toda a zona, que as levou a retraírem-se e não a fundirem-se. [8]

Calamidades naturais

Muita especulação e inverdades se encontram nas citações de Gore sobre as calamidades naturais que assolam a Terra de forma cada vez mais persistente a avassaladora. Eis o que Lewis revela e Gore ignora [9]:
• Desde 1950 que os tornados que afectam os USA (Gore refere-se principalmente aos USA em UVI) estão a diminuir. Se as consequências têm sido mais graves, isso deve-se a factores socioeconómicos, em especial a concentração das populações junto às costas e a falta de respeito pelas mais elementares regras de prevenção e segurança;
• O número de mortes devido a calamidades naturais (tornados, secas, e inundações) diminuiu 95% em relação a 1920 [10];
• As maiores secas nos USA ocorreram na segunda metade do século e em 1930, não nos anos mais recentes [11].
Também não corresponde à realidade, e só o oportunismo e o alarmismo podem justificar, que Gore defenda que o nível das águas dos oceanos esteja a subir a níveis assustadores. Eis o que Lewis revela [12]:
• O nível das águas dos mares subiu cerca de 1 mm por ano no século XX;
• Não é o Tamisa que está a subir, é Londres que se está a afundar – 60 cm no século XX;
• É verdade que o glaciar WAIS está a perder massa, mas também é verdade que o EAIS está a ganhar massa. Gore refere o primeiro e omite o segundo. No cômputo geral a Antárctida reduziu 0.09 mm por ano [13];
• É verdade que a Gronelândia está a recuar, mas é preciso dizer que a perda de 101 gTon, verificada entre 2003 e 2005, corresponde a um recuo de 2.8 cm por século [14]. Note-se que a perda de massa (água doce muito fria) no Árctico resulta em alteração considerável na Circulação Termohalina afundando mais tarde as correntes superficiais quentes que provêem do Pacífico Norte dirigindo-se para o Atlântico Norte junto às costas continentais [15].

Assim sendo

Coloca-se outra vez a questão: o que leva Gore a omitir informações tão importantes e a utilizar argumentos sem sustentação científica?
O objectivo da trilogia de artigos “Alterações Ambientais” não era travar a discussão sobre o possível aumento de temperatura do planeta. Nem debater sobre o efeito de estufa pela emissão de CO2. Estes artigos não visavam discussões técnicas. Tão pouco colocar Al Gore e os alarmistas do perigo ambiental em cheque.
Estes artigos foram escritos como contribuição para o melhor entendimento das guerras que se irão travar pelo acesso ao petróleo e outras fontes de energia, que irão fatalmente escassear à medida que as reservas forem diminuindo, e os países subdesenvolvidos forem tendo cada vez maiores necessidades energéticas. Em particular há que estar atento à forma como os países emergentes irão desenvolver as suas economias, a fim de alcançarem o bem-estar dos países desenvolvidos. No fundo, como ratear o que começa a escassear.

Nota final

A Caleidoscópio editou em 2008 outro interessante e sério trabalho intitulado “A mentira do Aquecimento Global – Mito ou Ciência?”, da autoria de Roy Spencer. Como síntese: “A terra não é um planeta frágil mas resiliente”. O autor defende que o sistema climático da Terra não é tão sensível às emissões de gás e ao efeito de estufa como muitos cientistas pensam. Vale a pena lê-lo.
Se o entusiasmo continuar, não percam também “O Mundo é Plano – Uma História Breve do Século XXI” (2007) e “Quente, Plano e Cheio” (2008), ambos de Thomas L. Friedman, editados pela Actual Editora. Numa perspectiva diferente, são obras igualmente fascinantes.

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NOTAS:

[1] Publicado em Portugal (2007) pela Gradiva, numa versão de 192 páginas para jovens, apoiada pela CGD. Uma versão integral data de 2006, tem 328 páginas e foi editada pela Manole, Brasil. Aqui para download: http://yesfilmes.org/2008/10/download-uma-verdade-inconveniente.html (cuidado: solicita o número do seu TM)
[2] Al Gore, jornalista de profissão, foi Vice-Presidente de Bill Clinton. Perdeu a campanha de 2000 para George W. Bush. O seu primeiro livro foi “A Terra em Balanço” (1993). Tornou-se um mediático ecologista.
[3] Marlo Lewis Jr é PhD em Governo (Harvard) e BA em Ciências Políticas (Claremont McKenna). Desempenha funções de Senior Fellow no Competitive Enterprise Institute
[4] Almedina (2008), 1ª edição, Bnomics
[5] Comenta Lewis que: “Al Gore tornou-se o representante de uma corrente alarmista que tenta condicionar as consciências dos cidadãos, jornalistas e políticos”
[6] El Pais, cit in Sábado n. 239, Nov 2008, p. 18
[7] Marlo Lewis Jr. (2008): A Ficção Científica de Al Gore, Cap. 2 – Os Glaciares de Montanha, Booknomics, p.p. 29-40
[8] op. cit., p.p. 29 - 31
[9] op. cit., p.p. 57 – 67
[10] op. cit., p. 211, Fig. 40, citando Goklany. Ver também op. cit., p. 204, Fig.29 (fonte: World Climate Report (2003), e Figs. 32 a 39, op. cit., pags206 a 210
[11] op.cit., p. 78
[12] op. cit., p.p. 117 - 134
[13] Lewis apresenta registos gráficos destes dados nas Figs. 68 e 69 p. 226 (op. cit.), citando como fontes, respectivamente, Velicogna e Wahr (2006) e Davis et al. (2005)
[14] A Gronelândia nos anos 1920 e 1940 era tão ou mais quente do que na década passada (Lewis 2008, p. 216, Fig 49), citando Chylek et al (2006)
[15] A corrente profunda fria da Circulação Termohalina parte do Atlântico Norte para o Pacífico Norte passando junto da Antárctida. Qualquer alteração neste circuito produzirá efeitos na flora e fauna dos oceanos e na Corrente Quente do Golfo que é ao grande estabilizar do clima no Hemisfério Norte. Ver esquema da Circulação Termohalina em Lewis (op.cit.) Fig. 53, p.218.

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